quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

SALVADOR, MEU AMOR


A PM baiana é negra. Não gostar de negros, se é assim, significa que recebe uma formação tipicamente nazista.”

Por Fernando Coelho*

SALVADOR, MEU AMOR. Sou um homem de Xangô. Sou ogan de Oxalá. Sou filho do Ilê Axé Opô Afonjá. Sou jornalista de quando jornalistas não eram sócios de patrões. Nem dividiam com eles o conceito da notícia. Conheço Salvador porque ando lá com a alma. Uso meus pés querendo construir o meu caminho.
Salvador é um templo brasileiro. Mesmo hoje, cidade quase morta. A luz de Salvador resiste. Sei que existem alguns corpos na periferia da cidade, jogados como lixo humano. Nas ruas, todos estão encapuzados. A polícia. Os bandidos. Outros traficantes. As autoridades. Levaram o ministro da Justiça à Bahia na hora errada. Eu o conheço de quando foi vereador de São Paulo. Honrado, ele. Enganaram o ministro. Microfones arrumadinhos, ar condicionado, coletiva com verbos imperativos não transitivos. O povo da Bahia jantando medo.

Como homem do santo, sinto que há algo de errado com o que o Brasil sente dos negros. Há um invisível preconceito daninho. E não gostar dos negros é não gostar do Brasil. O preconceito na Bahia é maior. Mais desumano. Mais falso, porque constrói o cadafalso da ambiguidade. A PM baiana é negra. Não gostar de negros, se é assim, significa que recebem uma formação tipicamente nazista. Negros não são traficantes. Negro é cidadão. Negro não é bandido. Negro é cidadão.

Negro, como todos os brasileiros, precisa de escola e trabalho. Salvador virou campo de guerra institucional. Os vereadores sumiram. Os deputados estaduais sumiram. Estão certos. Devem estar com medo, eles que muito usam o povo. O poder incoerente briga com o poder incompetente e a cidade vira o ambiente da miséria. Até porque as autoridades já destruíram a natureza vegetal, líquida, imemorial, nos limites da cidade.

Roubaram o verde de Salvador. Os ladrões são os donos das maquetes financeiras. Quem disse que alguém, seja qual for a patente militar que tenha, seja em casa, na caserna, cercado de seguranças, pode invadir o espaço de temor do povo. Tem corpos, sim, estirados nas ruas sagradas de Salvador.

As autoridades não sabem que Salvador é uma cidade sagrada. Não conhecem seu espírito. Não conhecem sua história elementar de resistência espiritual. As autoridades precisam saber que espíritos não dormem. Que o povo é expressão dos espíritos. Transformaram o baiano num pacote eleitoral. É o que se disputa forjando entrevistas, seriedade, discursos, alinhamentos sectários de pensamento político.

Aviso às autoridades que espíritos não votam. Espíritos esperam. Espíritos transformam. Espíritos pairam acima do Elevador Lacerda. Eles vão liberta Salvador dos maus espíritos, porque eles também existem. Eu rezo. E amo minha terra. Um homem precisa revelar-se.

* Fernando Coelho, jornalista profissional e escritor, é estudioso e pesquisador de meio ambiente, cultural brasileira e especialista em produtos de televisão. É autor da obra “Salvador-Guia de Cheiros, Caminhos e Mistérios”, livro que é referência histórica e cultural da cidade da Bahia, com apresentação de Jorge Amado e quatro edições esgotadas.
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